quarta-feira, 10 de abril de 2019

Buraco negro - uma fotografia

O que são os buracos negros:

Em termos genéricos, os buracos negros podem ser considerados como um dos possíveis estágios finais da vida de algumas estrelas. Dependendo de suas massas, as estrelas podem nos estágios finais, transformar-se numa anã branca, numa estrela de nêutrons ou num buraco negro. Ele seria originário de uma estrela que sofreu um colapso gravitacional após as reações termonucleares terem encerrado. Isso porque enquanto estão ocorrendo as reações termonucleares no núcleo da estrela, esse processo equilibra a atração gravitacional gerada pela imensa massa da estrela; quando a reação termonuclear acaba, a contração gravitacional predomina. Na verdade, a questão é mais complexa.

Uma estrela como o Sol, após queimar por um longo tempo o seu combustível nuclear, se transformará em uma gigante vermelha (A bela estrela Betelgeuse da constelação de Orion é um exemplo bem representativo do que seja uma gigante vermelha). Uma gigante vermelha é uma estrela que se expandiu em dimensão; no caso do Sol o seu diâmetro englobará a órbita da Terra. Mas à medida que superfície da estrela se expande, aumenta a massa do seu núcleo que conterá uma pequena massa da estrela, mas com uma grande densidade. Esse estágio é conhecido como anã branca. Passado mais algum tempo cessam todos os processos termonucleares e a estrela vira uma anã preta. Acredita-se que isso acontecerá mais cedo ou mais tarde com todas as estrelas que possuem uma massa de até 1,4 vezes a massa do Sol. Essa massa limite é chamada de limite de Chandrasekhar, que foi calculado inicialmente por Subrahmanyan Chandrasekhar em 1929 e independentemente por Lev Landau em 1930.

Se a massa da estrela estiver acima do limite de Chandrasekhar, a estrela também se transformará em uma gigante vermelha e o seu núcleo virará uma anã branca. Entretanto, a agregação de massa não parará e a repulsão das partículas da matéria pelo princípio de Pauli será inferior à pressão gravitacional extraordinária. Numa situação crítica a temperatura e a pressão serão tão grandes que reações nucleares produzem uma enorme quantidade de energia que é expulsa em forma de neutrinos. Eles aquecem bruscamente as regiões mais exteriores da estrela, freando o colapso gravitacional e produzindo uma explosão gigantesca, quando, então, a estrela se transforma numa supernova [1]. Mesmo após a explosão da supernova, permanece um núcleo que continua a colapsar gravitacionalmente, mas a densidade atinge valores altíssimos. Nessa situação a estrela é formada basicamente por partículas elementares denominadas de nêutrons, e o objeto celeste recebe o nome de estrela de nêutrons [2].

Se esse remanescente que formou a estrela de nêutrons possuir uma massa superior a 2,5 vezes a massa do Sol (o chamado limite de Landau-Oppenheimer-Volkov), então o colapso gravitacional não se encerra na estrela de nêutrons, criando-se então um novo corpo estelar, que é exatamente o buraco negro.

Um dos primeiros cientistas a cogitar a existência de buracos negros foi o francês Pierre Simon de Laplace, que nas duas primeiras edições do seu livro Exposition du Système du Monde (1796 e 1799) propôs que poderiam existir estrelas cuja alta densidade (por exemplo, uma estrela com as dimensões do Sol e a densidade da Terra) impediria que as "moléculas de luz" escapassem de sua atração gravitacional [3] (naquela época a ideia de fóton não estava devidamente estabelecida).

As ideias de Laplace e alguns dos seus seguidores eram demasiadamente especulativas, uma vez que não existia nenhuma teoria que desse sustentação a elas. Entretanto, após Albert Einstein publicar as equações do campo gravitacional em 1916, Karl Schwarzschild descobriu que uma possível solução para estas equações era algo que hoje é considerado o modelo mais simples de buraco negro. Nesse modelo mais simples o buraco negro teria simetria esférica e massa, mas a estrela que o deu origem não deveria ter rotação, nem carga elétrica, nem campo magnético [3]. Obviamente, outros tipos de buracos negros  seriam possíveis, tendo carga pequena, carga moderada, rotação lenta, rotação rápida, etc. 

Um aspecto fundamental dos buracos negros é os seus horizontes de eventos, uma fronteira no espaço tempo além do qual nem mesmo a luz pode escapar. Acredita-se que os buracos negros possuam massa variando num grande intervalo. Existem evidências da existência de (i) buracos negros com massas estelares (como observado por medidas no comprimento de onda de raios-X) e (ii) buracos negros supermassivos no interior de galáxias, com massas entre milhões e bilhões de vezes maiores do que a massa do Sol [4]. De fato, há mais de 40 anos especulava-se sobre a possibilidade de que no centro da galáxia M87 existisse um buraco negro [3].

A primeira fotografia de um buracos negro galáctico:

Hoje, uma equipe internacional de mais de 200 cientistas divulgou a imagem de um buraco negro que encontra-se no centro da galáxia M87. O buraco negro, que possui uma massa de 6,5 bilhões de vezes a massa do Sol, encontra-se a cerca de 55 milhões de anos-luz da Terra. Para conseguir a imagem, os pesquisadores juntaram informações fornecidas por oito diferentes radiotelescópios (espalhados pelos Estados Unidos, Hawaii, México, Chile, Espanha e Antártica) que trabalharam como se fosse uma única antena com a dimensão aproximada da Terra. Na verdade a imagem é criada pelo gás altamente aquecido produzido além do horizonte de eventos do corpo celeste, registrado com radiação no comprimento de onda de 1 mm. As fotografias 1 e 2 foram divulgadas hoje em conferências de imprensa e também através da publicação de um artigo científico [4].

Figura 1: Imagem do buraco negro no centro da galáxia M87 tal como revelado pelo projeto Event Horizon Telescope (EHT), Telescópio Horizonte de Eventos. 

Figura 2: Imagens do buraco negro no centro da galáxia M87 em quatro dias diferentes do ano de 2017 [4].



Referência:
[1] Duas supernovas muito famosas foram a observada em 1572, denominada de supernova de Tycho SN 1572,
e a observada em 1604, denominada de supernova de Kepler SN 1604. A denominação deve-se ao fato de que
esses dois pesquisadores foram os responsáveis pelas principais observações à época dos fenômenos.
[2] Roger Penrose, The emperor's new mind: concerning computers, minds, and the laws of physics,
Oxford University Press: New York, Oxford (1989).
[3] Ronaldo Rogério de Freitas Mourão, Buracos Negros: Universos em colapso, 2a. ed., Vozes: Petrópolis (1980).
[4] Kazunori Akiyama et al., Journal Letters 875, 
number 1 (2019).

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