quarta-feira, 23 de fevereiro de 2022

Estudando fósseis com raios-X

Os fósseis são objetos de grande interesse geológico e biológico devido ao fato de fornecerem informações sobre como era a vida no nosso planeta há milhões de anos. Existem diversas maneiras de se estudar esse tipo de material. Entre as várias metodologias há a possibilidade de se estudar essas amostras utilizando técnicas de caracterização físico-químicas (uma postagem que já discutiu os fósseis nesse blog foi publicada em 11/10/2016). Aqui, em particular, relembramos um trabalho apresentado há 15 anos por um grupo de pesquisadores do Ceará, do Maranhão e de São Paulo, no qual se mostrou que é possível investigar algumas características dos fósseis através de técnicas experimentais de absorção no infra-vermelho e difração de raios-X. Reproduzimos abaixo uma figura de um fóssil da Bacia do Araripe (período Cretáceo) e o resumo da comunicação científica apresentada no LASMAC2007, 1o. Simpósio Latino Americano sobre Métodos Físicos e Químicos em Arqueologia, Arte e Conservação de Patrimônio Cultural, que ocorreu em São Paulo, SP, Brasil, 11 a 16 de julho de 2007, no MASP – Museu de Arte de São Paulo “Assis Chateaubriand”.


Após alguns anos, muitos estudos em fósseis têm utilizado as mesmas técnicas. Um exemplo curioso é o trabalho apresentado na Ref. [1] em que foram investigados coprólitos (fezes fossilizadas) coletadas em dois diferentes locais pertencentes ao Permiano da Era Paleozóica. O primeiro é da Formação Pedra do Fogo, da Bacia do Parnaíba e o segundo é da Formação Rio do Rastro, da Bacia do Paraná. A pesquisa contou com a colaboração de pesquisadores do Maranhão, Piauí, Ceará e Rio Grande do Sul. Nela, forma utilizadas além das técnicas de difração de raios-X e espectroscopia no infravermelho, as espectroscopias Raman e de energia dispersiva. O objetivo do trabalho foi entender os processos de fossilização e tentar discutir aspectos relacionados aos hábitos alimentares dos animais que geraram os referidos coprólitos, provavelmente peixes cartilaginosos. O estudo mostra que embora os fósseis sejam de formações geológicas que se encontram a cerca de 3000 km uma da outra, as fases cristalinas majoritárias e a análise de elementos são semelhantes. As principais fases encontradas foram a hidroxiapatita, a calcita, a sílica e a hematita, indicando que a fossilização aconteceu sob condições similares via processos de silicificação e calcinação.

Figura 1: Coprólitos da (a) Formação Pedra do Fogo e (b) Formação Rio do Rastro [1].

Outro estudo com fósseis da Formação Pedra do Fogo foi realizado com troncos de plantas gimnorpermas [2]. Na região da Formação Pedra do Fogo existem muitos fósseis de plantas que foram preservados na posição de vida. Os troncos fossilizados foram analisados por espectroscopia vibracional (Raman e infravermelho), microscopia eletrônica de varredura (SEM/EDS) e difração de raios-X. Amostras de diferentes localidades foram escolhidas para se identificar e caracterizar compostos dos materiais fossilizados. Os estudos indicaram a presença dominante de sílica e confirmaram que o principal processo de fossilização é a silicificação por quartzo com contribuição adicional do carbono amorfo.
Figura 2: Fósseis de troncos de gimnospermas da Formação Pedra do Fogo [2].

Para encerrar essa rápida discussão sobre o uso dos raios-X no estudo de fósseis, registramos também o trabalho apresentado na Ref. [3]. Nele foram estudados diversos ossos do Eoceno (Período Paleoceno, Era Cenozóica) encontrados na Gruta do Urso Fóssil, no Parque Nacional de Ubajara, Serra da Ibiapaba, no interior do estado do Ceará. Nessa investigação, além das técnicas de difração de raios-X e espectroscopia infravermelho, também foi utilizada a técnica de fluorescência de raios-X. Com essa última metodologia experimental é possível determinar a quantidade dos elementos químicos presentes nas amostras, enquanto que com as outras duas técnicas é possível identificar as substâncias químicas existentes, como já demonstrado.  

Referências:
[1] Physicochemical analysis of Permian coprolites from Brazil, M.I.C. Rodrigues, J.H. da Silva, F.E.P. Santos, P. Dentzien-Dias, J.C. Cisneros, A.S. de Menezes, P.T.C. Freire, B.C. Viana, Spectrochimica Acta A 189, 93 – 99 (2018).
[2] Spectroscopic studies on Permian plant fóssil in the Pedra de Fogo Formation from the Parnaíba Basin, Brazil, D.M. da Conceição, J.H. da Silva, J.C. Cisneros, R. Iannuzzi, B.C. Viana, G.D. Saraiva, J.P. Sousa, P.T.C. Freire, Journal of King Saud University – Science 30, 483-488 (2018).
[3] Spectroscopic characterization of Eoholocene bones found in a cave in Northest Brazil, P.V. Oliveira, M.S.S. Viana, O.A. Barros, P.T.C. Freire, F.I. Bezerra, S.B.S. Gusmão, B.C. Viana, J.H. Silva, Journal of Spectroscopy 2018, Article ID 5039198 (2018).