sábado, 14 de agosto de 2021

Centenário de um divulgador de Astronomia

Esse ano comemora-se o centenário de nascimento do Prof. Rubens de Azevedo, fundador da Sociedade Brasileira dos Amigos da Astronomia (SBAA), ainda nos idos de 1947. Rubens de Azevedo foi professor na Universidade Estadual do Ceará e autor de diversos livros de divulgação como "Lua, degrau para o infinito", "Selene, a lua ao alcance de todos", "Na era da Astronáutica", "No mundo da estelândia", entre outros. Fundou o Observatório Astronômico da Paraíba e foi colaborador do Observatório do Capricórnio (inicialmente em São Paulo e posteriormente transferido para Campinas) quando ainda era dirigido pelo seu fundador, Jean Nicolini. Rubens de Azevedo é autor do primeiro mapa da Lua desenhado no Brasil, numa época em que a fotografia astronômica era uma atividade bastante incipiente. Participou de um programa internacional de observação dos chamados TLP (Transient Lunar Phenomena) que trata-se de brilhos excepcionais e ocasionais verificados em algumas crateras lunares. Durante as missões Apolos, no final da década de 1960, o professor Rubens de Azevedo colaborou com a observação da superfície lunar, conseguindo observar um vale que aparentemente estava ligado à cratera Grimaldi. Posteriormente esse vale foi confirmado por observações realizadas pelos astronautas enquanto sobrevoavam o nosso satélite.

Conheci o Prof. Rubens de Azevedo nas seguintes circunstâncias. Em 1977 havia uma coluna semanal de Astronomia no Jornal O Povo, de Fortaleza, denominada Cosmos e assinada pelo astrônomo amador Cláudio Pamplona. Meu pai levava periodicamente para casa a página dessa coluna. Em uma ocasião, Cláudio Pamplona informou que iniciaria um curso de astronomia popular, ou seja, para qualquer interessado sobre o assunto, na Casa de Juvenal Galeno, no centro de Fortaleza. A Casa de Juvenal Galeno era um espaço cultural onde havia reunião de poetas, músicos, pintores, e nas quartas feiras à noite se reuniam os sócios da SBAA. Meu pai se prontificou a ir comigo participar desse curso, e o frequentamos durante todo o ano (e em anos seguintes). A maior parte das aulas era ministrada pelo Prof. Rubens de Azevedo e algumas vezes havia também observações com pequenas lunetas, que se não me falha a memória, eram levadas pelo Prof. Rubens e pelo Cláudio Pamplona. As aulas eram bastante básicas porque o público era também muito eclético: havia estudantes do ensino fundamental como eu; um técnico em contabilidade, que era o meu pai; jornalistas; advogados; um juíz de direito, Marijeso Benevides; um torneiro mecânico; um general do exército; estudantes do ensino médio; engenheiros; professores de diversas disciplinas, entre outros. Muito didático, o professor Rubens de Azevedo falava de temas como o movimento dos planetas, as estações do ano, história da astronomia, coordenadas celestes, a Lua - que era a sua especialidade, o brilho das estrelas. Mensalmente ele distribuía com os sócios o periódico Zodíaco (um informativo mimeografado mensalmente por ele próprio) que na época era o órgão de divulgação tanto da SBAA quanto da UBA, União Brasileira de Astronomia, que por aqueles dias estava ancorada em Fortaleza também sob a presidência do Prof. Rubens.

O professor Rubens de Azevedo tinha verdadeira satisfação em divulgar a Astronomia. Lembro-me particularmente, que uns três anos após esse curso, visitava-o todas as tardes de sábado na sua casa, que ficava na rua Solón Pinheiro, 1580. O prof. Rubens possuía duas grandes bibliotecas, uma dedicada à Astronomia e uma outra dedicada a outros assuntos que também o apaixonavam, como a pintura, a música, a história, a cartografia, a arqueologia e a geografia. Ele deixava-me à vontade para pegar e ler os livros que quisesse durante aquelas tardes que transcorriam numa rapidez incrível. Às vezes eu tomava um café no final da tarde com ele e com sua sempre simpática esposa, D. Jandira Carvalho, embora a maioria das vezes eu recusasse o convite para não perturbar muito o velho mestre. Se eu tivesse dúvida sobre um determinado assunto, com muita paciência ele explicava, conectando a sua explicação a outras áreas do conhecimento. 

Em julho de 1978 ocorreu o II Encontro de Astronomia do Nordeste, em Recife, sob a coordenação do Pe. Jorge Polman, um entusiasta da Astronomia em Pernambuco. O Prof. Rubens de Azevedo iria participar do encontro indo de carona com o juiz de Direito Marijeso Benevides. Então iriam o juiz, sua esposa, o Prof. Rubens e a D. Jandira. Como sobrava um espaço no carro, consegui convencer o meu pai que seria interessante eu participar desse encontro e meu pai conseguiu convencer o Prof. Rubens de me levar com eles. Lembro-me que a viagem foi bastante agradável, o Prof. Rubens contando sua experiência de astrônomo amador e de participante de outros congressos de astronomia, falando sobre algumas histórias do seu pai, o poeta Otacílio de Azevedo, que havia falecido há poucos meses... O carro era um Fiat 147, acho que acabara de ser lançado. Na viagem paramos em Natal, onde visitamos um amigo do Prof. Rubens, Dr. Antonio Soares Filho, e depois rumamos para Recife. Na volta lembro-me que passamos em João Pessoa, que era uma cidade que o Prof. Rubens já havia morado e que ele gostava bastante (Foto 1).


Foto 1: Dr. Marijeso Benevides, esposa do Dr. Marijeso, eu e o Prof. Rubens de Azevedo em João Pessoa, 1978, no nosso retorno do II Encontro de Astronomia do Nordeste (foto D. Jandira Carvalho).

O II Encontro de Astronomia do Nordeste foi bastante marcante. O Prof. Rubens de Azevedo, se não me falha novamente a memória, falou da utilização do desenho nas observações astronômicas. Falaram também o Pe. Jorge Polman, o astrônomo Ronaldo Rogério de Freitas Mourão, além de outros astrônomos amadores de várias cidades do Nordeste (eu tinha um pequeno caderno onde fiz anotação sobre as várias palestras mas, infelizmente, o perdi). Após as apresentações as pessoas saíam e conversavam nos corredores, para mim era uma novidade interessante. Nesse encontro os organizadores também mimeografaram alguns textos e colocaram à venda para os participantes. Num desses intervalos fui olhar um dos materiais e lá encontrei o Sr. Francisco Coelho Filho, astrônomo amador cearense, e Ronaldo Rogério Mourão, astrônomo do Observatório Nacional no Rio de Janeiro (Foto 2). Há muitas outras histórias, noutra oportunidade retomo o tema.


Foto 2: No primeiro plano atrás da bancada: eu, Francisco Coelho Filho e Ronaldo Rogério de Freitas Mourão (II Encontro de Astronomia do Nordeste, Recife-PE, 1978).


Adendo em 30/10/2021Nesta sexta-feira (29), véspera do que seria seu centésimo aniversário, foi anunciado pela International Astronomical Union (Minor Planet Center) que o asteroide 84342 [2002 TP64], descoberto por Charles Juels e pelo brasileiro Paulo Holvorcem em 05/10/2002, acaba de ser nomeado oficialmente como (84342) Rubensdeazevedo.