terça-feira, 3 de outubro de 2023

Prêmio Nobel de Física 2023

Os três ganhadores do Nobel de Física 2023 estão sendo reconhecidos por seus experimentos, que deram à humanidade novas ferramentas para explorar o mundo dos elétrons dentro dos átomos e moléculas. Pierre Agostini, Ferenc Krausz e Anne L’Huillier demonstraram uma maneira de criar pulsos de luz extremamente curtos que podem ser usados ​​para medir os processos rápidos nos quais os elétrons se movem ou mudam de energia.

Eventos em movimento rápido fluem uns para os outros quando percebidos pelos humanos, assim como um filme que consiste em imagens estáticas é percebido como um movimento contínuo. Se quisermos investigar eventos realmente breves, precisaremos de tecnologia especial. No mundo dos elétrons, as mudanças ocorrem em alguns décimos de attosegundo, ou 10⁻¹⁸ segundos. Um attosegundo é tão curto que há tantos em um segundo quantos segundos desde o nascimento do universo. As experiências dos laureados produziram pulsos de luz tão curtos que são medidos em attossegundos, demonstrando assim que esses pulsos podem ser usados ​​para fornecer imagens de processos dentro de átomos e moléculas.

Em 1987, Anne L’Huillier descobriu que muitos overtones diferentes de luz surgiam quando ela transmitia luz laser infravermelha através de um gás nobre. Cada overtone é uma onda de luz com um determinado número de ciclos para cada ciclo da luz laser. Eles são causados ​​​​pela interação da luz laser com os átomos do gás; dá a alguns elétrons energia extra que é então emitida como luz. Anne L’Huillier continuou a explorar este fenômeno, preparando o terreno para avanços subsequentes. Mais adiante, em 2001, Pierre Agostini conseguiu produzir e investigar uma série de pulsos de luz consecutivos, em que cada pulso durou apenas 250 attossegundos. Ao mesmo tempo, Ferenc Krausz trabalhava com outro tipo de experimento, que permitia isolar um único pulso de luz com duração de 650 attossegundos.

As contribuições dos laureados permitiram a investigação de processos que são tão rápidos que antes eram impossíveis de se observar. “Agora podemos abrir a porta para o mundo dos elétrons. A física do attosegundo nos dá a oportunidade de compreender os mecanismos que são governados por elétrons. O próximo passo será utilizá-los”, afirma Eva Olsson, presidente do Comitê do Nobel de Física. De fato, é possível que existam diversas aplicações potenciais em muitas áreas diferentes como na eletrônica e na biomedicina, por exemplo, como em diagnósticos médicos [1].

É interessante destacar que além desses três personagens que ganharam o Prêmio Nobel, um pesquisador da Bell Labs, nos Estados Unidos, também pesquisava o assunto na década de 80 e desempenhou um importante papel. Trata-se de Chuck Shank, que desenvolveu técnicas para se atingir os femtosegundos. Shank trabalhou com o chamado laser com CPM (colliding pulses modelocking) com o qual se conseguiu pulsos de 60 fs. Shank, juntamente com Roger Stolen e Ippen, descobriram que passando o laser em uma fibra óptica, a automodulação de fase criava novas frequências, que vinham atrasadas ou adiantadas no pulso. Essa frequência que varia no tempo é chamada de chirp. O pesquisador Wayne Knox através do uso de uma grade de difração conseguiu cancelar o chirp e como consequência obteve um pulso de 8 fs.

Nesse ponto, entram em cena dois professores brasileiros vinculados ao Instituto de Física da Unicamp. O primeiro foi o Prof. Carlos Henrique de Brito Cruz, que trabalhou no Bell Labs entre 1986 e 1987. Brito incorporou um prisma, além da grade de difração, e obteve um pulso de 6 fs. Esse foi o récorde de pulsos curtos por mais de uma década. Depois, em 1988, chegou ao Bell Labs o Prof. Carlos Lenz César, ali permanecendo até 1990. Nesse período o Prof. Lenz conseguiu o pulso mais curto no infravermelho, cerca de 120 fs, utilizando para isso um laser de Centro de Cor [2]. 

Em 1992 descobriram que o laser de titânio-safira gerava pulsos de femtosegundos e era sintonizável. O Ferenc Krausz, de Viena, então colocou correção de chirp dentro da cavidade do laser de titânio-safira e conseguiu diretamente do laser, sem a necessidade de compressão de pulsos, corrigir o chirp e atingir pulsos de 10 fs. Daí chegou-se ao attomsegundos e o resto faz parte da história.

Notas:

[1] https://www.nobelprize.org/prizes/physics/2023/press-release/

[2] Depoimento do Prof. Carlos Lenz Cesar, Professor Titular no Departamento de Física da Universidade Federal do Ceará.