quarta-feira, 2 de junho de 2021

Novos alótropos do carbono

Após a descoberta do grafeno, que é um alótropo bidimensional do carbono, formado por hexágonos onde os carbonos estão ligados através de ligações sp2, foram realizadas várias tentativas de se conseguir outras estruturas bidimensionais. Sabe-se que na rede hexagonal do grafeno, nanoestruturas de pares pentágonos-heptágonos são vistas como defeitos nas fronteiras de grãos. Como relatado pelos autores da Ref. [1], numerosos cálculos sugerem que o controle desses defeitos podem auxiliar na sintonia das propriedades de materiais baseados no grafeno. O hidrocarboneto cíclico insaturado pentágono-heptágono, denominado de azuleno, pode ser obtido fundido em duplas, mas a sua construção com múltiplos pares de pentágonos e heptágonos só foi reportada no ano passado através da Ref. [1]. Realizando um reação térmica com um polímero organometálico incorporado com azuleno sobre ouro, conseguiu-se sintetizar uma estrutura de carbono sp2 formada por pentágonos e heptágonos fundidos [1]. A Figura 1(a) e (b) apresenta esse tipo de estrutura, tal como já era conhecido nas fronteiras de grãos, bem como uma representação da síntese do material (Figura 1(c)) através de um novo processo.

Figura 1: (a) e (b) Representação esquemática de pares pentágono-heptágono no grafeno; (c) formação de pentágonos-heptágonos de carbono sp2 fundidos de acordo com o processo de síntese apresentado na Ref. [1].

Uma vez que há a perspectiva de que esses materiais bidimensionais de carbono possuam interessantes propriedades mecânicas, eletrônicas e de transporte, várias pesquisas buscam encontrar novos alótropos bidimensionais. Há poucos dias (21 de maio) foi apresentado na revista Science [2] o relato do crescimento de um alótropo bidimensional com anéis de quatro, seis e oito átomos de carbono hibridizados sp2, conforme representação na Figura 2.


Figura 2: Representação da estrutura planar bifenileno [2].


Para produzir esse novo alótropo do carbono utilizou-se uma metodologia bastante engenhosa. Inicialmente, partiu-se do 4,4″-dibromo-2,2′,2″,5,5′,5″-hexafluoro-1,1′:4′,1″- terphenyl (DHTP) que foi polimerizado através do chamado acoplamento debrominativo em uma superfície de ouro e os conjuntos alinhados formados por cadeias de poli(2,5-difluoro-para-fenileno) (PFPP). Segunda os autores da Ref. [2], em uma segunda etapa, essas cadeias passam a apresentar acoplamento C-C pelo fechamento do HF (HF-zipping), formando a estrutura de fifenileno. Isso permitiu a formação de ligações C-C exclusivamente entre um C-F e um C-H, mas não entre duas unidades C-H ou duas unidades C-F (na Figura 3, representado pelos ovais azuis). Como consequência, anéis de quatro e oito membros são formados seletivamente entre as cadeias. Isso mostra que as unidades C-F são essenciais para a formação da estrutura não-benzenóide. Sem essas unidades C-F, o acoplamento C-C formaria a tradicional estrutura do grafeno.

Figura 3: Representação esquemática da produção do alótropo de carbono planar bifenileno [2].

A caracterização elétrica do material revelou que trata-se de uma estrutura metálica. Isso pode ser interessante para utilizá-lo como material de anodos em baterias de lítio. Adicionalmente, essa característica também faz com que esse material se torne um candidato para fios condutores em circuitos baseados no carbono, como apontado pelos autores da Ref. [2].

Referências:
[1] I.
  • C.-Y. Hou
  • Q. Sun
  • K. Eimre
  • M. Giovannantonio
  • J.I. Urgel
  • P. Ruffieux
  • , A. 
  • Narita
  • R. Fasel
  • K. Müllen, J. Am. Chem. Soc. 142, 10291 (2020).
  • [2] Q. Fan, L. Yan, M.W. Tripp, O. Krejcí, S. Dimosthenous, S.R. Kachel, M. Chen, A.S. Foster, U. Koert, P. Liljeroth, J.M. Gottfried, Science 372, 852–856 (2021).