quinta-feira, 22 de novembro de 2012

Índice de refração


            Uma importante característica dos materiais é o seu índice de refração. Antes de discutir mais pormenorizadamente este tópico vamos dar uma ligeira introdução sobre a entidade física utilizada neste tipo de medidas, ou seja, a luz.
            Para isso, lembremos que o Sol e as estrelas estão bastante distantes de nós (o Sol, em particular, encontra-se a cerca de 150 milhões de quilômetros da Terra), mas se conhece muito bem os elementos químicos que o compõem analisando-se a luz que dele chega ao nosso planeta. A luz atravessa o espaço vazio que separa o Sol da Terra numa velocidade muito grande, levando apenas pouco mais de 8 minutos para percorrer a gigantesca distância entre os dois astros. Esta característica, entretanto, é universal, ou seja, a luz percorre o espaço entre as galáxias na mesma velocidade, bem como consegue se propagar no espaço vazio sem necessidade de nenhum meio material para conduzi-la. Este fenômeno da luz, que pode ser vista como uma onda eletromagnética, é bem diferente do que ocorre, por exemplo, com o som, que necessita obrigatoriamente de um meio para se propagar (o ar, a água, um metal, entre outros).
            A luz, portanto, propaga-se no espaço vazio, mas também pode se propagar em outros meios. Por exemplo, quando se olha o exterior de uma casa ou de um ambiente através de uma janela de vidro bastante limpa, quase não se percebe que um objeto – o vidro – está separando o observador do exterior. Isto ocorre porque a luz foi transmitida através do vidro da janela, e dizemos que ele é um material transparente. Sob determinadas condições, o vidro também pode refletir a luz. Por exemplo, à noite, quando o exterior está escuro ou com pouca luminosidade e o interior do ambiente está iluminado com luz artificial (de uma lâmpada), é possível observar-se a luz da lâmpada refletida no vidro. Em outras palavras, o vidro também pode refletir a luz. Um outro fenômeno ocorre com a luz se a janela for feita de um vidro bastante espesso. Neste caso as imagens que vêm do exterior chegam menos nítidas ou embasadas, o mesmo acontecendo se a pessoa olhasse através de um plástico com certa espessura. Tal fenômeno é conseqüência do fato de que a luz também pode ser absorvida pelo meio material (o vidro, no caso específico do nosso exemplo).
            Além de poder ser absorvida, de ser transmitida e de ser refletida, a luz também pode sofrer outro fenômeno chamado de refração. Para exemplificar este fenômeno, normalmente sugere-se que seja colocada uma vareta ou um lápis dentro de um copo de água. Percebe-se com este simples ato que após a vareta ser colocada na água, aparentemente ela dobra no ponto em que ela penetra na água. Esta aparente dobra é resultado do fenômeno da refração da luz. Outros fenômenos podem ainda ocorrer com a luz quando ela interage com os materiais, por exemplo, um vidro vermelho ao ser colocado na trajetória de uma luz branca permitirá que apenas a luz vermelha seja por ele transmitida; a luz também pode ser espalhada, que é um fenômeno que será explicado mais adiante.
O que nos interessa no momento, entretanto, é o fato de que a luz apresenta o fenômeno de refração, ou seja, a luz muda de direção se um feixe de luz passa de um material para outro. Para discutir as leis físicas associadas ao fenômeno de refração, vamos considerar a Figura 1. Nela existem dois meios diferentes, o superior (em cor azul) que pode representar, por exemplo, o ar, e o inferior (em cor lilás), que pode representar outro meio, como a água ou vidro. Na figura também encontra-se representado um raio incidente, que faz um ângulo i com a normal e um raio refratado, que faz um ângulo r com a normal. O ângulo i é denominado de ângulo de incidência e o ângulo r é denominado de ângulo de refração. Através de uma série de experimentos, com diferentes ângulos de incidência e com diferentes materiais, descobre-se o seguinte importante resultado, que denominaremos de primeira lei da refração: O raio incidente, o raio refratado e a normal à superfície encontram-se todos no mesmo plano.

Figura 1: Geometria da refração, onde i representa o ângulo do raio incidente, r representa o ângulo do raio refratado em relação à normal.


            Fazendo-se uma série de experiências com diferentes ângulos de incidência da luz (num laboratório, geralmente utiliza-se a luz de um laser) e medindo-se para cada um deles, o ângulo de refração observa-se o seguinte resultado: o ângulo de refração para a luz que passa do ar para a água é sempre menor que o ângulo de incidência, com exceção do caso no qual o ângulo de incidência é 0o.
            Uma pergunta que poderia perfeitamente ser feita é a seguinte: e se em vez de água, o experimento tivesse sido feito com vidro, como seriam os comportamentos dos ângulos de incidência e de refração? A resposta também deve ser dada fazendo-se o referido experimento no laboratório. É possível descobrir-se que para o vidro também é verificado o fato de que o ângulo de refração para a luz que passa do ar para o vidro é sempre menor que o ângulo de incidência, com exceção novamente do caso no qual o ângulo de incidência é 0o. Em geral isto é verdadeiro para qualquer material transparente ou aproximadamente transparente, seja ele água, vidro, plástico, etc.
            Vamos, então, imaginar que um experimento é feito medindo-se diferentes ângulos de incidência e seus respectivos ângulos de refração quando a luz passa do ar para o vidro. Um resultado obtido da Ref. (PSSC, 1964) é apresentado na Tabela 1.

Tabela 1: Relação entre o ângulo de incidência i e o ângulo de refração r num experimento no qual a luz passa do ar para o vidro (PSSC, 1964).

Ângulo de incidência (o)
Ângulo de refração (o)
relação i/r
0
0
Indeterminada
10
6,7
1,5
20
13,3
1,50
30
19,6
1,53
40
25,2
1,59
50
30,7
1,63
60
35,1
1,71
70
38,6
1,81
80
40,6
1,97


            A partir desta tabela pode-se construir um gráfico com os pontos experimentais (bolas negras) e uma curva aproximada ligando estes pontos (em cor vermelha); tal gráfico é apresentado na Figura 2.


Figura 2: Geometria da refração, onde i representa o ângulo do raio incidente, r representa o ângulo do raio refratado em relação à normal.

            Uma coisa interessante é que a partir do gráfico da Figura 2 é possível prever qual seria o ângulo de refração para qualquer ângulo de incidência do sistema ar – vidro. Embora ele seja útil para descobrirmos qualquer valor de ângulos de incidência e refração do sistema ar – vidro, para outro material teríamos que ter outro gráfico. Ou seja, para cada par de materiais, existe um gráfico ângulo de refração versus ângulo de incidência bastante característico.
            A questão que levantamos é a seguinte: não existiria uma lei simples que nos fornecesse rapidamente o valor de um determinado ângulo de refração, sabendo-se o ângulo de incidência e os materiais que compõem o sistema? A resposta a esta pergunta é que existe uma tal lei, embora tenham sido levados centenas de anos para que ela fosse descoberta. Ptolomeu, o astrônomo grego que desenvolveu o sofisticado sistema geocêntrico com os seus ciclos e epiciclos, juntou vários dados relativos à refração de diversos materiais. Entretanto, ele não foi capaz de descobrir a lei relacionada à refração, que só foi obtida apenas em 1621 pelo físico W. Snell. Snell percebeu que existe uma relação simples entre seno do ângulo de incidência da luz e o seno do ângulo de refração, que depende apenas dos dois materiais que compõem o sistema. Mais precisamente, Snell descobriu que:

                        sen i / sen r = constante                                                            (Eq. 1)    .
           
No caso discutido anteriormente, em que um raio de luz sai do ar e penetra no vidro, têm-se que:

                        sen i / sen r = 1,50                                                                   (Eq. 2)    .

            O que é interessante é que esta relação dependerá do tipo de substância da qual a luz penetra após vir do ar. De uma forma mais rigorosa, a relação fornecida pela Eq. 2 representa o índice de refração do vidro em relação ao ar. Se em vez do ar, a luz antes de penetrar no vidro viesse do vácuo, a relação fornecida pela equação 2 seria ligeiramente diferente, embora não seja possível em experimentos simples verificar esta diferença. Isto porque, enquanto com o ar sen i/ sen r = 1,50000 (observe-se a grande quantidade de casas decimais), no vácuo teríamos sen i/ sen r = 1,50044. Nesta última situação, índice de refração no vácuo, dizemos que       se trata do índice de refração absoluto.
            Na prática, o índice de refração no ar é tão próximo do índice de refração no vácuo, que em poucas situações há a necessidade de distingui-los. O importante, nessa discussão é que o índice de refração é característico da substância que está em contato com o ar. Para exemplificar alguns índices de refração, apresentamos a Tabela 2.

Tabela 2: Índice de refração de alguns materiais (PSSC, 1964).

Material
Índice de refração
Vidro (diferentes composições)
Entre 1,5 e 1,9
Diamante
2,42
Quartzo fundido
1,46
Água
1,33
Glicerina
1,47
Álcool etílico
1,36


Referências:
Física Viva, Uma introdução à Física Conceitual, J. Trefil, R.M. Hazen, volume 1, LTC, São Paulo: 2006.
Física, Parte II (Physical Science Study Committee), UnB, Brasília: 1964.
Física, Parte 3 (Physical Science Study Committee), Edart, São Paulo: 1976.


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