A
queima de gasolina no cilindro de um motor de automóvel e o processo de
derretimento de uma pequena pedra de gelo são exemplos de problemas físicos que
não podem ser resolvidos pela aplicação direta das leis da mecânica estudadas
até este ponto. De fato, no primeiro caso, a quantidade de moléculas de
oxigênio, nitrogênio, xileno, etanol e hidrocarbonetos diversos é da ordem de
1024, o que impossibilita qualquer tentativa de resolução das
equações do movimento para os constituintes deste sistema. No segundo caso,
outros conceitos exteriores à mecânica serão necessários para se entender o
fenômeno de uma maneira qualitativa e quantitativa. Estes e outros exemplos
fazem parte de um conjunto de problemas estudados pela área da física conhecida
como termodinâmica, que trata dos diversos fenômenos físicos envolvendo o calor
e a temperatura, conceitos estes que serão discutidos neste capítulo.
A
descrição dos sistemas físicos dada pela termodinâmica é macroscópica, o que
significa que as propriedades tratadas estão em escala muito maior do que a
escala molecular, que é da ordem de 10-9 m. Em outras palavras, a descrição
termodinâmica não necessita fazer referência direta às propriedades moleculares
do sitema, embora em algumas situações possam ser úteis para um melhor
entendimento do problema.
As
grandezas macroscópicas utilizadas na termodinâmica para descrever os sistemas
físicos são a temperatura, a pressão, o volume, o campo elétrico, a polarização
elétrica, o campo magnético, entre outros. O conjunto de variáveis utilizado
para descrever o estado termodinâmico do sistema é chamado de variáveis
termodinâmicas ou variáveis de estado.
Exemplo 1:
Uma variável de estado bastante
importante em diversos problemas é o número de mols, ou moles. Um mol de uma
substância (símbolo n) é a quantidade daquela substância contendo um
número de Avogrado, (NA = 6,0221 x 1023) de moléculas.
Imagine um volume contendo 100
g de oxigênio, O2. Calcule o número de mols e
o número de moléculas de oxigênio neste volume.
Solução:
A massa molar do O2 é:
M = 2 x 16,0 g/mol = 32 g/mol
O número de mols no volume
considerado é:
n = massa da substância /
massa molar
n = 100 g / 32 g / mol = 3,5 mol
O número de moléculas na amostra
é:
N = n x NA =
3,5 x 6,0221 x 1023 = 2,1 x 1024 moléculas
Para
a construção do conceito de calor muitas hipóteses foram levantadas e diversos
experimentos foram realizados entre os séculos XVII e XIX por diversos
cientistas (Carnot, Clapeyron, Thomson, Clausius, Watt e Lavoisier, para citar
apenas uns poucos mais conhecidos). Este longo tempo de gestação do conceito
sugere que, certamente, em alguns pontos do processo histórico, muita dúvida
deve ter acometido os estudiosos do problema. Discutindo a natureza do calor no
trabalho Mémoire sur la chaleur, em 1780, Lavoisier e Laplace sintetizam
as duas interpretações mais aceitas na época da seguinte maneira:
"Os
físicos estão divididos sobre a natureza do calor. Muitos o tomam como um
fluido espalhado por toda a natureza, e pelo qual todos os corpos são mais ou
menos penetrados, à razão de sua temperatura e de sua disposição particular de
o reter. Outros físicos pensam que o calor não passa do resultado dos
movimentos insensíveis das moléculas da matéria (...) Nós não decidiremos entre
as duas hipóteses precedentes. Muitos fenômenos parecem favoráveis à última;
tal é, por exemplo, aquele do calor produzido pela fricção de dois sólidos; mas
há outros que são explicados mais facilmente pela primeira hipótese; pode ser
que haja lugar para as duas ao mesmo tempo."
O fluido
material e sutil que causava o calor foi denominado por Lavoisier de calórico.
Pouco a pouco percebeu-se, entretanto, que o calórico não explicava muitos dos
fenômenos observados na natureza e, paulatinamente, a hipótese do calórico foi
sendo descartada. Benjamin Thompson, o Conde de Ruford, por exemplo, analisando
detalhadamente o experimento de se furar um cano de canhão de bronze imerso na
água notou que o calor gerado por fricção parecia ser inexaurível; assim, para
o corpo isolado, como seria possível ele continuar a fornecer ilimitadamente calor
sendo o calórico uma substância material? Parecia mais lógico que o calor
estivesse associado a movimento.
Para
introduzirmos o conceito de calor tal como é aceito hoje pelos físicos
consideremos o seguinte experimento. Uma chaleira quente é colocada sobre uma
placa metálica que encontra-se a temperatura ambiente. Depois de um determinado
tempo observa-se que a chaleira também estará a temperatura ambiente. O que
acontece é que parte da energia da chaleira que encontrava-se inicialmente a
mais alta temperatura é cedida à placa que está mais fria. A energia cedida de
um corpo mais quente a um corpo mais frio que encontra-se em contato com o
primeiro é chamada de calor. Quando o processo de transferência de calor
acaba, diz-se que os dois sistemas encontram-se em equilíbrio térmico um
com o outro. De uma maneira mais geral, quando as variáveis de estado de um
sistema físico são constantes no tempo e uniformes em todos os pontos do
sistema, diz-se que o sistema encontra-se em equilíbrio.
O
contato assumido existir entre a chaleira e a placa metálica é do tipo
diatérmico, o que significa que calor pode ser transmitido de um corpo a outro.
Existem também as chamadas paredes adiabáticas, que não permitem que calor seja
transferido de um sistema a outro. As paredes adiabáticas podem ser vistas como
barreiras isolantes de grande eficiência.
Neste
ponto destaca-se que as temperaturas de sistemas físicos podem ser modificadas
sem necessariamente termos que colocá-los em contatos com sistemas de
diferentes temperaturas. Nos chamados processos adiabáticos, o contato com
corpos mais quentes ou mais frios não é muito importante para a transferência
de calor. Dando um exemplo clássico, quando se varia rapidamente o volume de um
gás, comprimindo-o ou expandindo-o dentro de um reservatório, ocorre variação
de temperatura sem que a temperatura das paredes do reservatório tenham grande
influência sobre o processo. Sendo mais preciso na definição, podemos dizer que
o calor é aquilo que é transferido entre dois sistemas, inicialmente a
diferentes temperaturas, até eles atingirem o equilíbrio térmico sem que
um dos sistemas realize trabalho sobre o outro.
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