quinta-feira, 8 de outubro de 2015

Simetria 1. Neutrinos e Flores

Nesta semana foi divulgado o nome dos ganhadores do prêmio Nobel de Física de 2015. Saiu para os pesquisadores Takaaki Kajida e Arthur McDonald que descobriram que os neutrinos emitidos pelo Sol mudam de forma no caminho entre a estrela e a Terra. Existem três tipos de neutrinos, cujas formas (ou classes) podem oscilar de uma para as outras. Embora esse tema específico seja discutido em outra postagem, o aspecto relevante destas palavras iniciais é o fato de que existem três diferentes tipos de neutrinos e que, simetricamente, existem mais três tipos de partículas que possuem spin, que é uma propriedade física particular relacionada ao momento angular, com valores bem semelhantes.

Na verdade, no que é conhecido como modelo padrão das partículas elementares, existem 12 partículas com spin semi-inteiro - os férmions (que por sua vez estão divididos em quarks e leptons) - e várias partículas de spin inteiro, os bósons. Acredita-se também que para cada férmion exista uma antipartícula. Na Figura 1 estão representados os férmions, que aparecem nas três primeiras colunas, e os bósons, que representam partículas de interação [no que diz respeito aos bósons, existem outros que não estão representados]. 


Figura 1: Partículas elementares dentro do modelo padrão [1]. 

Um detalhe que se destaca na Figura 1 é o fato de que para cada lépton de carga -1, o elétron, o muon e o tau, existe um neutrino correspondente. Na verdade, os três tipos de neutrinos são denominados de neutrino do elétron, neutrino do muon e neutrino do tau pelo fato de aparecerem em reações nas quais aquelas partículas estão presentes. O caso mais conhecido é o neutrino do elétron que surge quando um nêutron decai num próton, num elétron e num neutrino do elétron: n \rightarrow p + e^- + \bar{\nu_e}. Os quarks também aparecem em duplas: up e down, charm e strange, top e bottom. Tais aspectos podem ser explicados, dentro de certos limites, mas o mais importante é se perceber a presença marcante da simetria ao nível mais elementar da natureza [2].

Quando determinados quarks se unem em grupos de três, formam prótons e nêutrons. Quando estas duas últimas partículas juntam-se aos elétrons, formam todos os átomos existente no universo. É importante informar que a matéria ao nível atômico possui uma simetria relacionada ao fato da carga do elétron estar distribuída em torno do núcleo do átomo (onde estão os prótons e os nêutrons) [3]. Adicionalmente, quando vários átomos se juntam para formar moléculas e íons, novas simetrias surgem nestes arranjos, propiciando enxergarmos belíssimas estruturas, além de permitir aos homens a criação de descrições matemáticas relativamente simples por conta exatamente destas simetrias.

No nível macroscópico também é possível observar-se claramente a existência de simetrias. Estas simetrias estão presentes em vegetais, animais e em sistemas inanimados como cristais e minerais diversos. Entre os vegetais, as flores devem ser aquelas que mais despertam a atenção nos aspectos relacionados à simetria. Por exemplo, na Figura 2 apresenta-se a fotografia de uma Arenaria montana, encontrada, por exemplo, no norte de Portugal. Esta flor, como várias outras, é caracterizada pelo fato de ter uma simetria de rotação de ordem 5. Os espectroscopistas diriam que ela possui um eixo Cenquanto que os cristalógrafos diriam que ela possui um eixo 5. Isso significa que se a flor for girada de 72 graus em torno de um eixo imaginário que passa pelo seu centro, as pétalas ocuparão posições equivalentes. Na Figura 3 é apresentada uma flor de Plumeria rubra, conhecida em várias localidades do Brasil como jasmim manga. Assim como a Arenaria montana, o jasmim manga possui uma simetria de rotação 5.

Arenaria montana montana | Miguel Porto; CC BY-NC 4.0

Figura 2: Exemplo de uma flor onde aparece uma simetria denominada (pelos cristalógrafos) de 5. Curiosamente, este tipo de simetria não é permitido para os cristais.



Figura 3: Flor de Plumeria rubra, ou jasmim manga, que apresenta simetria 5. 

É interessante destacar que a natureza consegue um grau de sofisticação adicional produzindo flores com simetria 5, mas que para uma visão apressada poderia imaginar uma simetria 10. É o caso, por exemplo, da Stellaria holostea, que pode ser encontrada, entre outros locais, em Portugal, e é mostrada na Figura 4. 

Stellaria holostea | Paulo Ventura Araújo; CC BY-NC 4.0

Figura 4: Flor da Stellaria holostea onde é apresentada uma simetria 5, apesar de aparentemente existirem dez pétalas. 

Na Figura 5 é mostrada uma flor comum no Brasil, a Sisyrinchium micrantum, conhecida como cebolinha, que possui como característica a ocorrência de um eixo de simetria 6. Ou seja, sucessivas rotações de 60 graus em torno do eixo da flor produzem estruturas equivalentes à original.  


Figura 5: Flor da Sisyrinchium micrantum, popularmente conhecida como cebolinha, e sua bela simetria de rotação 6.


Referências:

[1] https://pt.wikipedia.org/wiki/Modelo_Padrão
[2] A simetria desempenha um papel muito mais forte ao nível subatômico do que podemos descrever nesta postagem. A teoria da eletrodinâmica quântica, por exemplo, prevê a existência de entidades chamadas condensados (chiral symmetry-breaking condensates), sendo o exemplo mais conhecido o par quark - anti-quark. Referido par se forma porque o espaço vazio é instável; na verdade, o vácuo é um ambiente explosivo, estando na iminência de explodir num par quark - anti-quark. Em outras palavras, a partir do nada pode surgir um quark, um anti-quark e uma certa quantidade de energia. Os leitores que ficaram interessados no tema podem procurar o belo livro de divulgação do Prof. Frank Wilczek, intitulado The lightness of being. Big questions, real answers.
[3] Há simetrias mais sutis relacionadas com os átomos e que pretendemos discutir mais adiante.